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terça-feira, 7 de setembro de 2010

O Dia Em Que Paulo Coelho Chorou

(O texto a seguir foi publicado online no Digestivo Cultural, e é de autoria de Domingos Pellegrini)

...fui entrevistá-lo graças a sua própria decadência, seus livros vendiam cada vez menos e alguns nem eram mais publicados. Por que, Paulo, perguntei, e ele: sei eu?! Só aceitei te dar entrevista, falou, porque você me enviou aquele artigo falando bem de minha obra há anos. Na verdade, falei, no artigo apenas digo que você levou muita paulada por despeito e preconceito, de uma imprensa que, por exemplo, nem se digna a divulgar livros infanto-juvenis e discrimina a autoajuda, enquanto é também cega para a carência ética na literatura, embora cobre ética dos políticos.

Pois é, disse ele, você falou mal até de Machado... E esclareci que apenas apontei ser o "grande gênio" um grande monstro ético, conforme Manuel Bandeira, e um maçante, conforme Millôr Fernandes; conforme eu mesmo, um escravagista, elitista, machista e cultuador de vigaristas, como seus protagonistas Brás Cubas e Bentinho. E os mesmos que não enxergam as monstruosidades de Machado, falei, malharam você por focar gente boa fazendo coisas boas e querendo melhorar. Ele sorriu, e continuou sorrindo enquanto falei que sua literatura centra-se na ética, Paulo, e a ética, para a intelectualidade brasileira, como para os políticos, é só para discurso.

Bem, ele falou, vamos à entrevista, e seu sorriso morreu quando fiz a primeira pergunta: no Diário de um mago, há um trecho em que o protagonista se exercita andando em câmera lentíssima, o que é um exercício antigo de teatro, e, em O alquimista, também há passagens que parecem literatura árabe requentada. Vários outros livros seus, continuei, partem de textos ou vivências alheias, o que parece fazer de você mais um recriador que um criador, não? Não sei, ele respondeu, depois de ficar tempo olhando através de mim. Acho que sim, emendou, daí me encarando como se fosse falar mais alguma coisa, mas não falou, como se aceitando o que falei.

Fiz a segunda pergunta esperando resposta menos monossilábica: como o desgaste de tudo é inevitável e a seleção é natural, quais os livros seus que ficarão? Você já citou dois, ele falou, e o terceiro... não sei. O Monte Cinco é que não será, falei, aquilo é uma grossa chatice. Ele sorriu triste, depois disse é, eu não escreveria de novo muito do que escrevi. Arrependido, então?, falei, e ele disse não, arrependido não, porque escrevi sempre com o coração. Mas então o que mudou, perguntei, o coração? A visão, ele falou, e eu falei eis Paulo Coelho, sempre manejando conceitos de autoajuda, imperdoável para quem acha autoajuda coisa apenas comercial.

Mas as parábolas de Jesus são autoajuda, falei, e ele emendou: o Alcorãotambém, e Confúcio; e Esopo, acrescentei, e ele acrescentou os Irmãos Grimm, e La Fontaine, e todas as autobiografias, pois o que o sujeito pretende ao escrever a própria vida, senão entender-se e ajudar os outros a entender a vida? Muitos também escrevem por vaidade, para se verem no papel como num espelho, pensei mas não falei; e ele como que adivinhou, faiscando o olhar antes de dizer: terceira pergunta?

A imprensa, falei, separou ficção de autoajuda, nas listas de livros mais vendidos, porque senão a lista ficaria apenas de autoajuda. A mesma imprensa que quer vender mais suas próprias revistas e jornais não aceita que um setor livreiro venda mais que o outro. E, de vez em quando, canaliza essa raiva contra um Augusto Cury da vida, como fez também com Paulo Coelho. Mas se quiser aumentar suas vendas, a imprensa não teria de entender e atender a essa gente cultuadora de Curys e Coelhos?

Paulo Coelho ficou me olhando e finalmente disse que a resposta já estava na pergunta. Quarta pergunta, comandou. Perguntei: já leu Paulo Setúbal? Quem? Paulo Setúbal, falei, foi o autor mais lido no começo do século passado, também foi da Academia, suas obras completas foram publicadas em capa dura, mas hoje quase ninguém mais lê. No megasebo Estante Virtual, Paulo, você tem dez vezes mais livros que ele. Ele de novo ficou olhando através de mim, até dizer bom, peguei o ponto, mas... não ficou nada do Paulo Setúbal?

Uma música com letra dele, falei, foi tema de novela da Globo. É, ele falou, de tudo fica um pouco, né, como disse o poeta. Que poeta, perguntei brincando, e rimos. Daí ele perguntou se eu aceitava tomar um rosé em vez de tinto, porque, com a idade, estava voltando a tomar rosé como na juventude... e concordei, pensando na palavra concordar, que vem de cordis, coração, e assim, já sem pensar no passado nem tentando antever o futuro, bebemos o momento, até que, de repente, ele lacrimejou, enxugou os olhos com os dedos, daí explicou que estava pensando em Paulo... Setúbal.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Cientistas não conhecem Shakespeare; Humanistas não conhecem Termodinâmica

Gostaria de publicar aqui trechos de um artigo escrito por João Moreira Salles (documentarista e professor da PUC-Rio). O artigo publicado na "Folha de SP", em 07 de junho, acho que no caderno "Ilustríssima", e pode ser lido online na íntegra na edição de 8 de junho do Jornal da Ciência, sob o título "Um documentarista se dirige a cientistas", ou no site da Academia Brasileira de Ciências, onde Salles discursou. O texto é principalmente uma crítica à sociedade brasileira que supervaloriza as artes e a desvalorização das ciências exatas. Para a maioria, são considerados 'intelectuais' os jornalistas, cineastas e sociólogos, enquanto as ciências exatas amargam uma posição sem status e até mesmo marginal.

Abaixo, o que considerei mais interessante do artigo aparece editado e grifado por mim. Por ser um texto muito bom, não pude cortar muito, mas consegui, a grandes custos, reduzir um pouco para abreviá-lo.

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Sou ligado ao cinema documental e, mais recentemente, ao jornalismo, atividades que, se não são propriamente artísticas, decerto existem na fronteira da criação. Jornalismo não é literatura nem documentário é cinema de ficção. Nosso capital simbólico é muito menor e nosso horizonte de possibilidades é limitado pelos constrangimentos do mundo concreto.


Não podemos voar tanto, e essa é a primeira razão pela qual, com notáveis exceções, o que produzimos é efêmero, sem grande chance de permanência. Não obstante, é fato que minhas afinidades pessoais e profissionais estão muito mais próximas de um livro ou de um filme do que de uma equação diferencial.


Em 1959, o físico e escritor inglês C.P. Snow deu uma palestra sobre a relação entre as ciências e as humanidades. Snow observou que a vida intelectual do Ocidente havia se partido ao meio.


De um lado, o mundo dos cientistas; do outro, a comunidade dos homens de letras, representada por indivíduos comumente chamados de intelectuais, (um termo sequestrado pelas humanidades e pelas ciências sociais, segundo Snow).


Aos artistas, interessaria refletir sobre a precariedade da condição humana e sobre o drama do indivíduo no mundo. O interesse dos cientistas, por sua vez, seria decifrar os segredos do mundo natural e, se possível, fazer as coisas funcionarem. Como frequentemente obtinham sucesso, não viam nenhum despropósito na noção de progresso.


Na qualidade de cientista e homem de letras, Snow se movia pelos dois mundos, cumprindo um trajeto que se tornava cada vez mais penoso e solitário. Ele concluiu que a falta de diálogo fazia mais do que partir o mundo em dois. A especialização criava novos subgrupos, gerando células cada vez menores que preferiam conversar apenas entre si.


Seria um desperdício não haver comunicação com com matemáticos, por exemplo, pois a matemática, para além dos seus usos, é guiada por um componente estético, por um conceito de beleza e de elegância que a maioria das pessoas desconhece.


O que move os grandes matemáticos e os grandes artistas, desconfio, é um sentimento muito semelhante de síntese e ordem. Os dois grupos teriam muito a dizer um ao outro, mas, até onde sei, quase não se falam. (No passado, o poeta Paul Valéry deu conferências para matemáticos e o matemático Henri Poincaré falou para poetas.)


Segundo Snow, com a notável exceção da música, não há muito espaço para as artes na cultura científica: "Discos. Algumas fotografias coloridas. O ouvido, às vezes o olho. Poucos livros, quase nenhuma poesia."


Talvez seja exagero, não saberia dizer. Posso falar com mais propriedade sobre a outra parcela do mundo, e concordo quando ele diz que, de maneira geral, as humanidades se atêm a um conceito estreito de cultura, que não inclui a ciência.


Os artistas e boa parte dos cientistas sociais são quase sempre cegos a uma extensa gama do conhecimento. Numa passagem famosa de sua palestra, Snow conta o seguinte: "Já me aconteceu muitas vezes de estar com pessoas que, pelos padrões da cultura tradicional, são consideradas altamente instruídas. Essas pessoas muitas vezes têm prazer em expressar seu espanto diante da ignorância dos cientistas. De vez em quando, resolvo provocar e pergunto se alguma delas saberia dizer qual é a segunda lei da termodinâmica. A resposta é sempre fria - e sempre negativa. No entanto, essa pergunta é basicamente o equivalente científico de 'Você já leu Shakespeare?'. Hoje, acho que se eu propusesse uma questão ainda mais simples - por exemplo: 'Defina o que você quer dizer quando fala em 'massa' ou 'aceleração'', o equivalente científico de 'Você é alfabetizado?' -, talvez apenas uma em cada dez pessoas altamente instruídas acharia que estávamos falando a mesma língua".


O que eu teria a dizer sobre ciência fica perto do zero. Por outro lado, como especialista na minha própria ignorância, posso discorrer sobre ela sem embaraços. Com as devidas ressalvas às exceções que devem existir por aí, estendo minha ignorância a todo um grupo de pessoas e me pergunto de quem seria a responsabilidade por sabermos tão pouco sobre as leis que regem o que nos cerca.


As respostas são previsíveis. Em parte, a responsabilidade é dos próprios cientistas, que não fazem questão de se comunicar com a comunidade não-científica; em parte é dos governos, que raramente têm uma política eficaz de promoção da ciência nas escolas; e em parte - e essa é a parte que mais me interessa- é nossa, das humanidades, que tomamos as ciências como um objeto estranho, alheio a tudo o que nos diz respeito.


A quase totalidade dos personagens de classe média da literatura e do cinema brasileiro contemporâneos pertence ao mundo dos artistas e intelectuais. São jornalistas, escritores (geralmente em crise e com bloqueio), professores (quase sempre de história, filosofia ou letras), antropólogos, viajantes (à deriva), cineastas, atores, gente de TV ou filósofos de botequim. Quando muito, um empresário aqui, um advogado acolá. Cientistas são pouquíssimos, se bem que no momento não me lembro de nenhum.


--> [LIB: Uma exceção que me ocorre agora é o filme O Maior Amor do Mundo, de Cacá Diegues, mas ainda que achássemos outras 10, sequer arranharíamos o argumento de Salles!]

É como se, do lado de fora das disciplinas criativas, não houvesse redenção. Em "Cidade de Deus", o menino escapa do ciclo de violência quando recebe uma máquina fotográfica e vira fotógrafo. Não parece ocorrer a ninguém -nem aos personagens, nem ao público- a possibilidade de ele virar biólogo, meteorologista ou mesmo técnico em ciência.


Uma das minhas obsessões é folhear a revista dominical do jornal "O Globo". Existe ali uma seção na qual eles abordam jovens descolados na saída da praia, de cinemas, lojas e livrarias, para conferir o que andam vestindo. No pé da imagem, informa-se o nome e a profissão da pessoa.


Acompanho essas páginas há um bom tempo, e estatisticamente o resultado é assombroso. Conto nos dedos o número de engenheiros, médicos ou biólogos que vi passar por ali. Eles não podem ser tão malvestidos assim. De duas, uma: ou são relativamente poucos, ou a revista prefere destacar as profissões que considera mais charmosas.


As duas alternativas são muito ruins, mas a segunda me incomoda particularmente, pois sei por experiência como é poderosa a atração exercida por algumas profissões com alto cachê simbólico.


Existem no Rio quatro universidades que oferecem cursos de cinema; no Brasil, são ao todo 28, segundo o Cadastro da Educação Superior do MEC. No ano passado, a PUC-Rio formou três físicos, dois matemáticos e 27 bacharéis em cinema.


Existem 128 cursos superiores de moda no Brasil. Em 2008, segundo o INEP, o país formou 1.114 físicos, 1.972 matemáticos e 2.066 modistas. Alimento o pesadelo de que, em alguns anos, os aviões não decolarão, mas todos nós seremos muito elegantes.


Segundo dados de um relatório do IEDI, a taxa de formação de engenheiros no Brasil é inferior à da China, da Índia e da Rússia, países emergentes com os quais competimos.


Compramos coisas que foram pensadas lá longe, as quais serão brevemente superadas por outras coisas que também não terão sido pensadas aqui. É um processo estéril. Escritores, cineastas e editores de suplementos dominicais se espantariam em saber que, na China, a proficiência em matemática desfruta de uma forte valorização simbólica.


Na Índia, um jovem programador de software se sente no topo do mundo.


Enquanto isso, como lembra o matemático César Camacho, diretor do IMPA, várias universidades brasileiras têm vagas abertas para professores de matemática, não preenchidas por falta de candidatos. A valorização das ciências entre nós é pífia. Sempre me espanto com a presença cada vez maior de projetos sociais que levam dança, música, teatro e cinema a lugares onde falta quase tudo.


Nenhuma objeção, mas é o caso de perguntar por que somente a arte teria poderes civilizatórios. Ninguém pensa em levar a esses jovens um telescópio ou um laboratório de química ou biologia? Centenas de estudantes universitários gostariam de participar de iniciativas assim.


É imprudente tomar uma decisão definitiva aos 18 anos de idade, mas é exatamente o que têm de fazer os alunos ao entrar na universidade - embora, como norma, eles não saibam para o que têm vocação.


Se em algum momento a vocação se manifesta, em geral o aluno e sua família consideram que é tarde. Circunstâncias econômicas ou psicológicas dificultam muito um ajuste de rota. (Começar de novo exige determinação férrea... Sei bem como é, porque foi o meu caso.)


É absolutamente certo que, neste momento, alguns milhares de jovens estão prestes a cometer o mesmo equívoco.


Muitos se revelarão apenas medianos ou preguiçosos, e é provável que a ciência não tenha como alcançá-los. Sem desmerecer os excelentes alunos de cinema, letras ou sociologia, é impossível negar que, para alguém sem grande talento ou dedicação, será sempre mais fácil ser medíocre num curso de humanas do que num de exatas.


Alguns desses jovens sem orientação provavelmente terão inclinação para as ciências e ainda não descobriram. É preciso criar mecanismos que os ajudem a escolher o caminho certo. Infelizmente, as artes e as humanidades, pelo menos por enquanto, não colaboram muito. Ao contrário. Nós disputamos esses jovens e, infelizmente, até aqui estamos ganhando a guerra.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Crítica à Marcelo Gleiser

Em terra de cego, quem tem um olho é rei. Acho que o sucesso que o Marcelo Gleiser faz por aqui como divulgador científico tem a ver com não haver no Brasil uma divulgação científica de alto nível (DEFINIÇÃO: Alto nível = Sagan, Asimov, Penrose, ...).

Li e gostei muito d'A Dança do Universo. Depois que li outros livros, pecebi que os exemplos que ele dá estão em qualquer livro, que não há ali nenhum ponto de vista, nada de novo. Como escritor, ele é tão competente quanto um tradutor (quer dizer: tem lá seu talento, é claro, mas não é propriamente um autor). O prazer que me deu a leitura se explica pela minha ignorância. Suporte para essa idéia é eu ter lido anos depois O Fim Da Terra E Do Céu, Cartas A Um Jovem Cientista, e parte dos Retalhos Cósmicos... Tentei ler as colunas na Folha também, mas me entediei logo: tudo lugar-comum.

Mas eu gosto do trabalho dele. Faz algo que deve ser feito no Brasil. Quando eu pensei em ser físico aos 14 anos de idade, me preocupava a idéia de que o único físico vivo que eu conhecia era o Stephen Hawking. Eu não sabia o que os físicos faziam. Tinha a impressão de que não havia físicos no Brasil. Talvez hoje, os programas do Fantástico que o Marcelo fez ajude alguém a pelo menos saber que há pesquisas sendo feitas hoje. Até que apareça algo melhor, o Marcelo Gleiser faz um excelente trabalho aqui...

... aqui, só aqui!

Por aí pelo mundo, não há muito espaço para os lugares-comuns. Não vi o novo livro dele, mas li reportagens sobre o assunto, declarando a tese principal, a de que talvez não exista uma Teoria Unificada e que talvez esta busca esteja fadada ao fracasso. (Aliás, pelas resenhas, supus que não havia idéia nova: o que ele afirma parece basicamente idêntico ao que Lee Smolin afirma na sua crítica à teoria de cordas.... mas eu de fato não sei, é só um preconceito!)

Como disse, eu não li o livro, de modo que não posso mesmo falar sobre isso. Mas escrevi esta postagem para dar este link aqui. É uma crítica feroz de Lubos Motl ao livro (e ao próprio Marcelo, que tem suas publicações analisadas por Lubos, o que resulta em um comentário maldoso: "O cara é um idiota. É um exemplo da fábula 'A Raposa E As Uvas', em que uma raposa tenta pegar três uvas, falha, e decide que as uvas eram azedas. Gleiser afirma que tendo ele próprio fracassado como um indivíduo, toda a física deve fracassar também.").

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

O Médico e o Monstro

Recomendo o último capítulo do Dr. Jekyll and Mr. Hyde, de Robert Louis Stevenson... Não que o resto do livro não seja bom, mas é que sendo uma história muito conhecida, o mistério que se constrói ao longo do livro não cativa, já que sabemos a solução desde o início. Por outro lado, o último capítulo é praticamente um ensaio sobre a natureza humana e vale a pena ser lido, mesmo que já se conheça a trama.... aliás, se alguém ainda não conhece a solução do mistério, sugiro que leia logo o livro antes que alguma reportagem, filme ou conversa de bar estrague o prazer desta leitura! E, novamente: Mesmo que já conheça a história por outros meios, não deixe de ler o último capítulo, que não demora nada e juro que não há inconvenientes em começar a leitura neste ponto!

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Novo paradigma para educação


Em vez de melhorar o Mundo para nossos filhos, não seria boa ideia melhorar nossos filhos para o Mundo?

quinta-feira, 9 de julho de 2009

O Filme Relativístico

Assistir ao Transformers - A Vingança dos Derrotados é, apesar dos momentos de angústia, uma experiência verdadeiramente fascinante.... do ponto de vista científico, é claro. Acontece que o filme se passa a velocidades relativísticas, de modo que o espectador experimenta uma das mais fascinantes previsões da teoria da relatividade de Einstein: a dilatação temporal.

O tempo próprio do filme é de 147min. Entretanto, ao observador em repouso em relação ao cinema, a duração do filme é quase infinita! Houve momentos em que imaginei que não iria acabar nunca! Felizmente, consegui dormir (ou seja, entrei em uma ponte de Einstein-Rosen) e esse atalho no espaço-tempo me permitiu sair do cinema-laboratório após fim do filme.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Os Efeitos Colaterais de uma Maçã.

Em diversos sítios [1, 2, 3] há uma crônica de Luís Fernando Veríssimo sobre a curiosidade humana, que começou com uma mordida numa maçã que Deus proibira e avançou a tal ponto que gastamos cerca de R$ 10 bilhões para construir um túnel de quase 27 km para chocar dois prótons (coisa que a maioria das pessoas nunca viu, e provavelmente nunca verá) só para ver se de lá surge uma partícula chamada Higgs (que ninguém nesse planeta viu até agora). Além disso, com o Grande Colisor de Hádrons (LHC) pretende-se descobrir [4, 5, 6] porque há mais matéria do que antimatéria (novamente, coisa que poucos já ouviram falar.... depois do livro do Dan Brown, o termo ficou até mais familiar para alguns, mas estes continuam a saber nada sobre o assunto). E otras cositas más (supersimetria [7], buracos negros, plasma de quarks-glúons, etc), mas quero falar é sobre a crônica do Luís Fernando Verísimo.

É claro que somente ficamos sabendo o que o Veríssimo pensa sobre o assunto pq contamos hoje com um sistema de troca de informação chamado internet, que foi desenvolvido na Organização Européia de Pequisas Nucleares (CERN), local onde o povo estuda essas coisinhas que ninguém vê. Mas eu não vou repetir toda aquela história de ciência básica, nem recontar a velha história de Michael Faraday perguntando à rainha da Inglaterra pra servem os bebês, muito menos pesquisar tudo o que foi desenvolvido à partir de idéia que eram, à princípio, apenas curiosidade, ou 'vaidade científica', como diz o Veríssimo... Abaixo, reproduzo na íntegra essa crônica, que tirei de uma das fontes que dei acima:

A Doença da Curiosidade - (Luís Fernando Veríssimo)

Santo Agostinho escreveu que entre as tentações, uma das mais perigosas era a “doença da curiosidade”, que nos levava a tentar descobrir os segredos da natureza, “aqueles segredos que estão além da nossa compreensão, que em nada nos beneficiarão e que o Homem não deve tentar saber”. Foi, em outras palavras, o mesmo conselho que Deus deu a Adão e Eva no Paraíso, advertindo-os a não comer o fruto da árvore do saber para não contrair a doença. Eva – sempre elas – não se agüentou e comeu o fruto proibido. Resultado: o Homem perdeu o paraíso da ignorância satisfeita e está, desde então, tentando descobrir que diabo de lugar é este em que o meteram, esta bola girando entre outras bolas num espaço imensurável, sem manual de instrução. Santo Agostinho e outros tentaram nos convencer a aceitar os limites da fé como os limites do conhecimento. Tentar compreender mais longe só nos traria perplexidade e angústia e nenhum benefício. Mas a doença já estava adiantada demais.

A fase mais aguda da doença da curiosidade chegou com a inauguração, esta semana, num subterrâneo na fronteira da Suíça com a França, do tal acelerador gigante que jogará prótons contra prótons em condições inéditas para tentar reproduzir a origem de tudo, liberar uma subpartícula atômica que até agora só existe em teoria e chegar mais perto de descobrir como funciona o Universo. Quer dizer, os descendentes de Adão e Eva pretendem levar a rebeldia do casal ao máximo e espiar por baixo do camisolão de Deus. Segundo alguns, o que o novo acelerador também pode trazer é um castigo terminal pela desobediência humana: o desaparecimento num buraco negro não só dos cientistas envolvidos e de alguns suíços e franceses na superfície, mas do mundo todo. Com você e eu, que não temos nada a ver com a história, atrás.

O cataclismo é improvável, mas mesmo que a insubmissão do Homem não seja punida, resta a outra questão posta por Santo Agostinho, a do benefício. Que proveito, salvo para a vaidade científica, trará descobrir o que pretendem? Quanto mais se sabe sobre o funcionamento do Universo mais aumentam a perplexidade e a angústia por não se saber mais, por jamais se poder compreender tudo – pelo menos não com este cérebro que mal compreende a si mesmo.

Mas a toxina daquela fruta era forte e ainda age no organismo. E a doença é incurável.

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... Um texto muito bom, como são sempre os textos do Veríssimo. Mas nos deixa com a idéia de que a ciência básica é apenas um capricho... Depois que provamos daquela maçã, não só tivemos em nós a curiosidade despertada, como também a vergonha e talvez a auto-crítica. O homem quase que instintivamente analisa seu próprio comportamento em sociendade e, para ver até onde nossas emoções podem chegar, criamos imagens e textos que nos provocam a alma. Seguindo a mesma linha de raciocínio, eu me pergunto se não seria a arte, a música e a literatura também apenas um fruto da 'vaidade humana', ou seja, mais um efeito colateral da maçã... Afinal, um livro como Comédias da Vida Privada não tem pretensões de curar doenças. Apenas nos conduz à uma viagem pesoal através dos nossos próprios sentimentos, dos comportamentos do 'homem civilizado', e das nossas emoções. E quem de nós viu isso? Quem de nós viu o amor mais do que a um próton? Penso que não só os cientistas, mas todos os seres humanos estão condenados pela mordida que Adão e Eva deram naquela maçã, quando ainda eram apenas inocentes macacos.

segunda-feira, 3 de março de 2008

É importante duvidar!

O desenho acima, do cartunista Sidney Harris, me lembra uma frase famosa de Carl Sagan:
"Uma afirmação extraordinária exige evidências extraordinárias."
... Por vezes as pessoas falam que os cientistas são céticos e que são fechados para novas idéias e até acontece de ouvirmos críticas aos contemporâneos de alguns gênios do passado, cujas teorias não foram aceitas facilmente. Mas é fácil criticá-los quando nossa perspectiva da história nos fornece a vantagem de saber quais idéias eram boas e quais eram ruins. Vejo muita gente dizendo que devemos duvidar do que é tido como certo pelos outros e das teorias vigentes. Mas poucas pessoas enfatizam como é importante duvidar do novo também. Passam a idéia de que duvidar do antigo é revolucionário e original, a própria personificação do gênio. Enquanto que duvidar do novo revela um conservadorismo prejudicial e uma visão bitolada do mundo. Escondidas nos registros históricos, deve haver muitas idéias para as quais a rigidez em aceitar o novo nos salvou de dar um passo atrás...

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Quando falar inglês?

O texto do Feynman que publiquei ontem remete a uma questão sobre a qual penso há tempos: "Quando falar inglês?".

Nos encontros internacionais, me parece claro que a coisa mais razoável é que os palestrantes falem em inglês, mesmo sendo um encontro sediado no Brasil e que a maioria dos ouvintes sejam brasileiros. Eu não gostaria nem um pouco de ir lá na Rússia para um encontro internacional e alguém falasse em russo.

O que eu não sei bem como responder é quando há estrangeiros num encontro nacional, algo parecido como o que o Feynman relata. Por exemplo, neste ano, no Encontro Nacional de Física de Partículas e Campos, havia convidados de fora. Estavam lá, por exemplo, Glenn Starkman e Lee Smoolin. Esses caras foram convidados para fazer com que os próprios brasileiros se inscrevessem no encontro, já que se estivessem lá apenas palestrantes daqui, eu sei que o número de participantes diminuiria. Aí, pedimos aos gringos que, por favor, venham aqui darem o ar de sua graça. Não seria educado de nossa parte permitir que participassem do restante do encontro? Por outro lado, e os brasileiros? Claro que para ir a um encontro nacional, o sujeito não precisa saber o inglês e é claro que em caso de optar, é mais justo agradar aos donos da casa... O Feynman contou a história de modo a parecer absurdo que tentassem agradá-lo. Não sei se foi tão absurdo como o tom jocoso dele indica...

Bom, tudo isso é pra me justificar, pois se eu fosse um daqueles palestrantes, eu teria talvez optado pelo inglês e me sentiria ofendido pelas palavras do Feynman. (É bem verdade que ali, tínhamos um caso especial, já que o gringo falava um pouco de português).

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Deve ser brincadeira, Sr. Feynman!

Richard P. Feynman foi um dos grandes físicos do século XX. Participou do projeto americano de fazer a bomba atômica, deleitava-se abrindo cofres (sem saber a senha) e tocava bongô. Além disso, tinha um humor e um grande talento para contador de história. Juntando tudo isso num mesmo homem, resultou numa vida cheia de episódios bons de contar. O próprio Feynman contou alguns deles.

Abaixo, um trecho do livro "Deve ser brincadeira, Sr. Feynman!", em que fala de sua experiência no Brasil.

No Brasil, pensei, a princípio, que faria minhas palestras em inglês, mas percebi uma coisa: quando os estudantes explicavam algo para mim em português, eu não entendia muito bem, apesar de saber um pouco de português. [...] Aí descobri que, se quisesse conversar com eles e tentar ensiná-los, seria melhor eu falar em português, mesmo sendo precário como era. Seria mais fácil para eles entenderem.

Na primeira vez que estive no Brasil, por seis meses, fui convidado a fazer uma apresentação na Academia Brasileira de Ciências, sobre algum trabalho em eletrodinâmica quântica que eu havia acabado de fazer. [...] Comecei escrevendo minha palestra em um português totalmente confuso. [Aí, dois estudantes brasileiros] ajeitaram a gramática, consertaram as palavras e deram uma melhorada. [...]

Cheguei à reunião da Academia Brasileira de Ciências, e o primeiro palestrante, um químico, levantou-se e deu a palestra – em inglês. Ele estava tentando ser educado, ou o quê? Eu não conseguia entender o que ele estava dizendo, por causa de sua pronúncia, que era péssima, mas talvez alguma outra pessoa tivesse o mesmo sotaque e tenha conseguido entendê-lo; eu não sei. Então o próximo palestrante levanta-se e dá a palestra em inglês!

Quando chegou a minha vez, levantei-me e disse: “Desculpem; eu não havia percebido que a língua oficial da Academia Brasileira de Ciências era inglês, e por isso não preparei minha palestra em inglês. Então, por favor, desculpem-me, mas terei de fazê-la em português”.


Além do trecho acima, há mais para ler sobre a experiência de Feynman no Brasil neste link.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Pan 2007 - Mais do Mesmo

Henrique Guimarães escreveu um post digno de ser lido no blog Ciência e idéias. Ele fala das vaias durante o Pan, no Rio. Especialmente ao presidente Lula.

Às vezes penso que de tanto dizerem que o "brasileiro esquece das coisas", que "aceitam pacificamente" e que "é um país corrupto", as pessoas tendem a metralhar o que vêem pela frente quase sem pensar. Não defendo os políticos, mas acho que grande parte das críticas, quando questionadas, são justificadas com um vago "é um ladrão, safado".

No texto do Henrique há uma citação à Luís Fernando Veríssimo, que disse em "Cumplicidade" (leia o texto na íntegra no Zero Hora):

“ Veja onde você está metido, com quem está fazendo coro, de quem está sendo cúmplice. A companhia do que há de mais preconceituoso e reacionário no país inibe qualquer crítica ao Lula, mesmo as que ele merece. Enfim: antes de entrar num coro, olhe em volta.”