terça-feira, 29 de maio de 2007

O Auto da Montanha

Há tempos sentia imensa alegria
Ao admirar aquela bela montanha.
Certa manhã, acordou à revelia
Decidido a tentar tal façanha.

Pois desejava o topo conquistar,
E chegar àquele longínquo cume,
Para sentir na face a brisa soprar
E respirar o seu leve perfume.

Assim, seguiu decidido à baia,
E montou em seu cavalo manco
E ali permaneceu, de tocaia,
Esperando por algum solavanco.

Mas logo viu que já na vertente
Havia cavaleiros e até romaria
E deduziu mais que corretamente
Que por ali jamais conseguiria.

Foi então que buscou outra trilha
Mais íngrime, mais extensa escalada.
Tomou fôlego e apertou bem a cilha,
E rumou enfim à crista desejada.

Por ser mais longa essa sua trilha,
Muito mais do cavaleiro ela exigia
Inclusive um estado de total vigília
E cuidado com as pedras que havia.

Mas aconteceu que, já cansadíssimo,
Pegou no sono no momento crucial,
No instante em que chegou ao cimo,
De onde prosseguiu seu manco animal.

E, estranhando a descida, acordou,
Vendo afastar de si a bela crista,
E as imagens com que há pouco sonhou
Pensando consigo, muito pessimista:

"Eis que não volta o tempo maldito!
Tampouco pára esse maldito cavalo!"
E sentiu pesar no seu peito aflito
A beleza da crista ainda a encantá-lo.

Nenhum comentário: